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ARTE À LA PARTE

     Enquanto os raios de sol ainda sonolentos entrecortavam a rodoviária de Cacoal, um delicioso cappuccino era saboreado ao som de Guinga e Francis Hime, que apresentavam na TV da lanchonete o novo trabalho autoral dos renomados artistas.
       Era chapiscando açúcar na xícara quente, petiscando o Biscoito Fino e de olho no violão. Estalava os beiços quando o piano emergia. Os demais se atracavam aos pães de queijo e pastéis, nem se davam conta do espetáculo. Vez ou outra, olhares esguios arriscavam encarar a famigerada música que invadia o local. A ojeriza e o desprezo lustravam a cara dos clientes. Por alguns momentos imaginei que o aparelho estivesse com seus dias contados, não passaria ileso nessa fatídica manhã. Os ilustres compositores contavam histórias homéricas sobre grandes parcerias com Vinícius e Paulo César Pinheiro. Baladas e bossas complexas harmonizavam minha audição, mas o repúdio era maior que o prazer. O dono ameaçava mudar o canal, mas o movimento contínuo do caixa não o deixava sair do lugar. Seus olhos eram de pavor e remorso. Estava em frangalhos do outro lado do balcão, com os tímpanos sofridos e as mãos frias, preocupado em não errar no troco.
       Pobre Francis, mísero Guinga, fizeram uma apresentação magistral para apenas uma pessoa da plateia, nem sabem que fartaram minha fome. Os demais saíram ao encontro dos compromissos rotineiros, em jejum, repletos de seus vazios. 

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