Pular para o conteúdo principal

Policarpo

     Hoje o Policarpo me deu o ar de sua graça, mas de seu xará literário, o Quaresma, não tem nada de quixotesco, ostenta apenas o ofício de ceder sua monta. O baita reconheceu logo minha hesitação em desconfiar de sua submissão, mesmo assim apenas murchou as orelhas pardas e partiu a dividir comigo seu mundo.
     Marcelo, Ilto e Almiro iam troteando à frente; e enquanto meu companheiro cumpria sua tarefa árdua naquelas veredas, estupefato o admirava pela resiliência em suportar o montador e as pedras que fustigavam seus cascos. Na sela não iam apenas o peso do corpo, as lembranças de meu pai, a saudade de minha mãe, mescladas à alegria de contemplar todo cenário que guarneceria minha família, vinham na garupa, mas o animal não reclamava, seguia firme sua jornada.
     No trajeto de volta, em meio à chuva que regia a estreia da aventura, já acostumado com a lida, abocanhou a forrageira, ouviu minhas orações e pareceu ter compreendido o tal gesto, erguendo a cabeça e retomando sua missão cerimoniosa.
     Ao chegarmos no curral, vislumbrei que o bicho não tem nada de burro, fez-me compreender os ensinamentos de Jesus sobre a mansidão: a qualquer momento poderia ter demonstrado toda sua força e me lançado fora de seus arreios, mas permaneceu resguardado em sua cordialidade.
     Os apetrechos e eu aliviamos seu espinhaço, mas ele acenou com uma zurrada, permitindo que minha gratidão continuasse escanchada em seus lombos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

MATANDO O FRANGO

     O Criador absoluto de todas as coisas, em sua infinita misericórdia, resolveu se revelar ao homem através da morte e ressurreição do seu filho amado, Jesus Cristo, bem como manifestando a sua vontade evidenciada na Bíblia, mas também tem usado homens e mulheres como canais de bênçãos sobre a terra.  Assim ele o fez quando permitiu que alguém me trouxesse uma realidade tão evidente, porém em uma frase aparentemente tosca e rudimentar: “Você precisa matar o frango”. Tal expressão ficou martelando meus neurônios durante dias e a compreensão exata dessa comparação trouxe um ensinamento valioso que precisa ser colocado em prática, mas não é tão simples assim.       No Evangelho de João, capítulo 3, versículo 3, há um processo que desencadeia a libertação, isso acontece quando alguém entende que está terminantemente perdido, enlaçado nas tramas do pecado, gerando arrependimento por tais práticas, trazendo o entendimento...

Terra abençoada

Escanchado em meu alazão  Pelas veredas saí garimpando Olhos sedentos, voz entoando Cada canto desse meu rincão  Se estava sonhando ou acordado Ia juntando no alforge, em meu afã Drummond, Milton, Cordel  Euclides, Sivuca, Noel Patativa, Vinícius, Djavan Eita, que país arretado! O sabiá do Dias em meu ombro pousou enquanto cantava, mais relíquias eu via Caymmi, Elis, Machado, quanta alegria! Matizes de encanto, um show! Riquezas que não abdico Cabral, Ivan, Caetano, Tarsila Francis, Edu, Bilac, Heitor, Gil É um espetáculo esse Brasil! Do Gonzaga, do Tom e do Villa Do Ary, do Rosa, da Cecília e do Chico. Só aqui tem Lobato e Iracema mugunzá, caruru, vatapá  tucupi, dendê, açaí, tacacá Amazonas, saudade, Ipanema Lugar onde apoita a felicidade. Apiei o cavalo e fiz uma prece não pude continuar a jornada De lágrimas, a camisa encharcada, Será que tudo isso a gente merece? Disse-me Deus: é minha bondade!