Entre uma aula e outra, numa rápida
conversa entre professores, a vida me posicionou na carteira de aprendizado e,
como aluno, absorvi a lição de casa:
- Meu filho já tem quase dois anos e até hoje dorme em nossa cama –
disse um deles, confirmando a tal decisão do casal.
O outro sapecou à queima roupa um tiro certeiro em meu coração:
- O meu dormiu comigo até os sete anos. A Psicologia que se dane, amar
demais nunca fez mal a ninguém!
Um
átimo de lucidez acertou-me em cheio e o turbilhão de informações tirou-me de
cena. Vislumbrei minha mãe em seus benditos excessos: os olhos contemplativos
na estrada não cessavam de me esperar e o sono já se esvaía porque o amor
protagonizava o momento do reencontro; as preocupações constantes eram
despejadas em mim, sem tréguas, avolumadas de um sentimento que me acompanhavam
como sombra.
De repente, o primeiro sorriso de minha filha, Clara, aos 2 meses de
idade, encurralou-me e atônito não hesitei em crer na extravagância deste
sentimento devidamente incontido.
Como se o sufoco não bastasse, fui atropelado pelas nuances de sua mais pura
essência desconcertante: Jesus. Em um de seus episódios, perguntou à mulher
apanhada pelos fariseus em flagrante adultério:
- Onde estão os teus acusadores? Ninguém te condenou? Eu também não te
condeno, vais e não peques mais. Em outra ocasião, após efetuar a cura em um
homem das mãos mirradas, rasgando ao meio o protocolo das
tradições humanas que gritavam
- É lícito curar nos sábados?
Ao que o Mestre, de prontidão, afirmou:
- É lícito fazer o bem.
Noutro momento, chegou a um cego de
nascença e o questionou:
- O que queres que eu te faça?
Ora, o que mais deseja um homem sem visão, a não ser enxergar? É o amor conscientizando sua obviedade.
E a fustigação continuava “amar demais nunca fez mal a ninguém” dilacerando-me as entranhas. Era o tal, escancarado, sem modéstia, totalmente despido. Em seu âmbito não há espaço
para o “politicamente correto”, ele extrapola todas as fronteiras, rompe as
barreiras do preconceito, acolhe os desvalidos, ampara os trôpegos e
cambaleantes na estrada da existência, quebra tabus, descortina o véu de
qualquer lógica, esgarça todos os medos e estampa sua cara sem maquiagem, ensolarada de prazer.
Compreendi suas extrapolações e ouvi o verbo encarnado acenando pra mim, sussurrando:
- Pode ir pra sala, sua nota já está lançada com letra escarlata, no livro da vida.
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