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Louvor na terra e no céu (in memorian)

     Cantar nunca foi sinônimo de louvar. Quem assim o faz alcança apenas aplausos de um público incapaz de ouvir o som que vem do coração. As cordas vocais não ultrapassam o teto e se desmancham no ar porque entoam sua própria glória. 

     As formas mais eloquentes de louvor residem no silêncio, é quando a voz embargada empresta à dor uma cantiga sublime que ecoa até os céus. Um choro incontido, vestido de uma gratidão escarlata, soa como solfejos que acariciam os ouvidos do Criador. Assim foi a experiência de Elias quando percebeu que Deus não estava no vento impetuoso que esmiuçava as penhas, nem ao menos no terremoto estrondoso, tão pouco manifestou-se no fogo, mas a realeza reluziu estampada na mansidão e delicadeza.

     Louvar implica necessariamente adorar, não é um ato sonoro ou ancorado na afinação. Não há técnicas para sua aprendizagem, apenas disposição em vislumbrar nossa insignificância. Na verdade, quando os olhos se fecham e as bocas emudecem, brota o perfeito louvor, pois no íntimo, nos porões da alma, a música ressoa para o único ouvinte digno no anfiteatro. Neste momento, Ele rearmoniza o som, inverte os papéis, nos coloca na plateia e sobe ao palco para receber os aplausos por sua performance.

     O louvor não está enclausurado no que o rotulam de movimento gospel, ele era livremente encontrado nas audições que minha mãe e eu fazíamos nos acordes dissonantes do jazz ou nas aventuras sonoras salpicadas pelos ritmos nordestinos.

     Hoje ela estaria completando 80 anos de idade e continuamos a louvar, a diferença é que seus olhos contemplam o maestro de perto e eu, cá no fim do auditório, vislumbro apenas sua batuta, enquanto minha saudade a aguarda para nos encontrarmos ao fim do espetáculo.

Feliz aniversário, mamãe!

Te amo!

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