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Mostrando postagens de 2024

Saudade

     "Pássaros urbanos", de Raimundo Fagner, apesar de ter sido lançada em 2014, somente alguns anos depois passamos a apreciar esta pérola do nosso cancioneiro. Digo "passamos" porque a obra foi alvo de inúmeras audições entre minha mãe e eu. Nesses momentos éramos arrebatados pela música, um sentimento avassalador que só pode ser encontrado na esfera da paixão.       Quando a primeira faixa se iniciava, o som das castanholas faziam com que ela erguesse os braços e girando na sala, fosse transportada para o solo espanhol, enquanto eu dividia as atenções entre o violão e a bateria, dando socos e palhetadas no ar. Era nosso transe cultural. Quem flagrasse esse estágio contemplativo pensaria em nos conduzir a um manicômio. Não posso denominar essa comoção de amor. O amor é calmaria, quietude, ternura, paciência, maresia, elo existente entre os alucinados ouvintes em questão. Paixão é loucura, furacão, ausência de senso do ridículo, febre, insanidade, o v...

Sapiência sobejante

      Aboletou-se em meio a uma roda de conversas esparsas e sapecou à queima roupa seu falatório pomposo:      - Disso eu conheço bem, sou cientista, não sei se sabem?!      Dois deles encolheram os ombros, numa mescla de assombro e desorientação, sendo ligeiramente alertados pelos demais:      - Esse é seu Ícaro, o cabra mais sabido da região. Ícaro não sei das quantas... (destrinchou o prenome, sobrenome,  comprido que só o diacho, porque cientista que é cientista deve ostentar pelo menos meio metro de escrivinhatura, firmada na força da proparoxítona exigida na pronúncia).      Tomou conta da roda e palestrou com os holofotes acesos em pleno meio-dia.       Seu Ícaro era um outdoor ambulante, espalhafatoso, emblemático, rotava sua reluzência por onde passava e sua ignorância nata assumia ares de elegância, vestia-se de uma sabedoria pelega e brilhava sua ostentação fajuta.   ...